Dependência de quem?


Andei relendo minha monografia e achei isso interessante...


Com a realização deste trabalho foi possível, também, identificar índices de preconceitos em realção à dependência dos deficientes visuais não apenas por parte dos videntes, mas em alguns casos por eles mesmos. Boa parte admite não se sentir confortável com a ideia de que sempre irá precisar do auxílio de outras pessoas para executar tarefas que de outra forma executaria com facilidade.


No entanto, a dependência vai muito além de contar com ajuda de outros no ato da compra, como se a dependência resumisse apenas nisso. Certa vez uma garota fez um discurso em sua formatura e disse que não dependemos de ninguém para realizar nossos sonhos, que basta nossa determinação e força de vontade para alcançarmos o nosso objetivo. Afinal, somos nós que pagamos nossas contas e não devemos satisfação a ninguém.


Assim como essa garota, existem milhares pessoas que pensam de maneira semelhante e ignoram a possibilidade de depender dos outros, como se fosse algo terrivelmente vergonhoso. Você pode pagar suas contas, mas até para a água que tanto necessita chegar a sua torneira você depende de pessoas capacitadas e dispostas a fazer isso, independente da motivação. É muito comum estigmatizarmos os cegos e sentir pena deles por serem indivíduos dependentes, mas quem não é? O que seria das obras de artes em suas galerias se não houvesse pessoas para admirá-las? O que é uma marca ou a posse de um artigo de luxo se não há a quem se exibir? Se não há como compará-la? Somos todos animais que por mais que o orgulho não permita admitir dependemos uns dos outros.


O autor José Saramago ilustra perfeitamente a nossa dependência da visão e das pessoas no livro Ensaio Sobre a Cegueira. O romance nos leva a fazer diversas reflexões acerca de nossa forma de vida, nossos costumes e caráter. Depois que todas as pessoas perdem a visão para que serve o nome, formação ou conquistas? Tornam-se como cachorros que se conhecem pelo cheiro, pelo ladrar, pelo falar. Quando se encontram na mesma situação procuram se agrupar como se quisessem proteger um ao outro, contudo, quando se deparam com seus interesses próprios a solidariedade é questionável. Isso nos leva a pensar que não existe reciprocidade no medo egoísta, por outro lado não há racismo na cegueira, se não, a apatia pelo proceder que desagrada. Uma cor não te faz superior nem inferior a ninguém. Não há beleza a não ser a de um caráter irrevogável e a do respeito com seus semelhantes.


Sendo assim, este trabalho não tem a pretensão de ser conclusivo, ao contrário, ele pede para ser superado. Pois, ainda há o que explorar, uma vez que o universo do deficiente visual tem muito mais a oferecer não apenas em termos de pesquisa científica para um trabalho acadêmico, muito mais para nosso aprendizado como seres humanos que precisamos aprender a lhe dar com as diferenças, a não fazer acepção de pessoas que sentem dificuldades em executar tarefas que para nós, titulados normais, são simples de realizar e a não nos julgarmos superiores sentindo pena de quem possui um sentido a menos.


Afinal, “qualquer um pode tentar recriar o mundo para construir, no seu lugar, um outro mundo, em que seus mais insuportáveis aspectos são eliminados e subistituídos por outros que estão em conformidade com os desejos de qualquer um”. (FREUD apud ANDRÉ, 2006).

Até quando


Ela era linda até enxarcada de rugas, era doce até quando sua alma ardia de amargura, gentil até quando em alta voz xingava horrorosos palavrões. Ela conseguia ser forte até mesmo quando o medo saltava aos olhos, divertida até quando não havia resquícios de alegria em seu semblante, sorridente até quando lhe faltavam todos os motivos do mundo. Ela conseguia ser companheira até estando ausente. Era mãe até quando não precisava e amiga até quando precisava não ser. E continua sendo minha mesmo tendo me deixado há tanto tempo.

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